quinta-feira, 20 de dezembro de 2012

Imparcialidade, indiferença e ignorância

"Imparcialidade é um nome pomposo para indiferença, que é um nome elegante para ignorância", assim Chesterton define essa palavrinha que, a cada dia que se passa, ganha mais contornos e importância na laicização da sociedade e na apatia dos jovens modernos diante da nova realidade que se descortina diante de nossos olhos.

 Poderia tratar deste tema a partir de infinitas perspectivas. A verdade é que a apatia e a falta de motivação é uma realidade escancarada nas sociedades pós-modernas desenvolvidas e em vias de desenvolvimento.

 Entretanto, diante dessa preguiça espiritual que paralisa os homens de hoje, gostaria de me deter acerca de um tema em específico: os pais que se negam a educar religiosamente os seus filhos. O pretexto é muito bem conhecido e divulgado principalmente em ambiente permeados pelo neo-ateísmo: educar religiosamente os filhos é impor-lhes como que uma espécie de lavagem cerebral. Deve-se, pois, deixar que a criança chegue à idade da razão e decida, por si própria, o caminho que deve seguir. Esse comportamento seria o coroamento da liberdade e da tolerância diante da imposição irracional de uma orientação religiosa.

 O argumento parece ser, numa análise bastante superficial, dotado de alguma razoabilidade, mas apenas numa análise muito superficial. Com efeito, quando analisamos esse fenômeno a partir de uma perspectiva mais ampla, levando-se em consideração seus efeitos, veremos como esse comportamento pode se revestir de uma índole altamente destrutiva.

A criança é um ser místico por excelência. Ela encontra-se completamente desembaraçada de nossa prisão mental fatalista e determinista. Com o tempo, passamos a crer que as coisas são assim porque tem que ser assim. A criança sabe que não. Para ela, tudo é absolutamente inexplicável, pois ela sabe que vivemos no mundo da fantasia, enquanto nós esquecemos disso. A criança acha tão natural ver um dragão voando como ver um urubu plainando. Ela sabe da arbitrariedade do fato e do mistério. Entretanto, nós nos encontramos completamente perdidos pela força do cotidiano e pelo orgulho da ciência.

 A verdade é que nós não conhecemos nada acerca do mundo que nos cerca. Apenas observamos os fenômenos e tentamos explicá-los à luz de nossas parcas noções sobre algumas realidades. A ciência moderna gosta bastante de falar em "leis", mas é uma terminologia que carece de sentido. Com efeito, para que pudessemos descrever uma lei que rege a natureza, deveríamos conhecer todos os seus dispositivos mais íntimos.

 Entretanto, conhecendo uma ínfima parcela da realidade circundante, achamo-nos no direito de recorrer ao determinismo e acreditar piamente que, quando soltamos uma maça, o único destino possível e imaginável é o chão. A criança sabe que não o é. A criança tem então um pendor inato ao místico. Alías, todos nós o temos, mas, muitas vezes, o amor ao vil e as preocupações da vida obscurecem nosso espírito. Mas não é de espíritos de crianças que é feito o Reino dos Céus? Ela é livre para concluir o que bem entender, sem as paixões da vida ou as tentativas de auto-justificação turvarem sua intuição acerca do belo, justo e verdadeiro.

 Assim, essa sede de verdade a faz repetir inumeráveis vezes aquela palavrinha que tanto nos irrita nas criancinhas: "mas, porquê?". E a lista de "porques" se sucedem, um após outro, na tentativa de buscar o fundamento último dessa realidade. Mas geralmente suas pretensões esbarram na nossa pressa, incapacidade ou impaciência. Longe de limitar ou de doutrinar a criança, a educação religiosa a permite ver mais longe e melhor. "Se vi mais longe- dizia Newton- foi por estar de pé sobre ombros de gigantes".

Não há dúvida que a educação religiosa permite à criança uma base na qual ela possa posteriormente desenvolver seus pensamentos, seus estudos e suas conclusôes. A partir daí sim, pode-se dizer que realmente ela é livre para escolher o caminho. Não se pode falar em liberdade de optar se o sujeito não conhece de verdade as opções. Negligenciar a religiosidade dos filhos sob o pretexto de que os mesmos podem posteriormente escolher o que quiserem é como que deixar de alimentar os filhos sob o argumento de que os mesmos devem escolher o que comer. É matá-lo espiritualmente e esperar que, por um milagre de Deus, ele ressuscite.

 Ademais, como já abordado, longe de limitar as futuras opções da criança, a educação religiosa fornece as bases necessárias para que ela possa optar, realmente ciente de sua escolha. Com efeito, na cultura superficial em que vivemos, se o jovem não tiver uma sede autêntica pelas realidades mais sublimes, o único contato que ele possivelmente terá com a religião é uma mera contrafação, um espectro deformado da verdadeira realidade, pois, diante das novas realidades culturais e mercadológicas que se expandem, as religiões se apresentam como verdadeiros obstáculos à plena efetivação dessa nova imposição cultural pós-moderna.

 Por fim, quero deixar claro que, em nenhum momento, quis abordar a questão sob uma perspectiva relativista. As religiões não são iguais, nem transmitem a mesma mensagem, nem têm as mesmas finalidades. Sei que, em todas, há "sementes de verdade" e de humanidade, mas nem se comparam ao Esplendor da Verdade trazido por Cristo.

 Enquanto escrevi essas linhas, sei que, sob a face de milhares de infantes, escorreram brilhantes gotas d´água enquanto o sacerdote pronunciava o seu nome e o incorporava à Esposa de Cristo. Fico feliz por essas crianças, pois sei que possivelmente seus anseios serão parcialmente atendidos durante os seus tenros anos; mas, ao mesmo tempo, lamento profundamente aquelas que terão como símbolo de nascimento apenas as letras frias de um documento cartorário e que, pelo menos durante seus primeiros anos, serão- como dizia Sto. Agostinho-, como que peregrinos sem meta; questionados sem respostas, lutadores sem vitórias e peregrinos sem nova vida.

 Entre tanta imparcialidade, indiferença e ígnorância, a humanidade ainda segue combalida, mas de pé. Ainda.

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