quinta-feira, 20 de dezembro de 2012

Imparcialidade, indiferença e ignorância

"Imparcialidade é um nome pomposo para indiferença, que é um nome elegante para ignorância", assim Chesterton define essa palavrinha que, a cada dia que se passa, ganha mais contornos e importância na laicização da sociedade e na apatia dos jovens modernos diante da nova realidade que se descortina diante de nossos olhos.

 Poderia tratar deste tema a partir de infinitas perspectivas. A verdade é que a apatia e a falta de motivação é uma realidade escancarada nas sociedades pós-modernas desenvolvidas e em vias de desenvolvimento.

 Entretanto, diante dessa preguiça espiritual que paralisa os homens de hoje, gostaria de me deter acerca de um tema em específico: os pais que se negam a educar religiosamente os seus filhos. O pretexto é muito bem conhecido e divulgado principalmente em ambiente permeados pelo neo-ateísmo: educar religiosamente os filhos é impor-lhes como que uma espécie de lavagem cerebral. Deve-se, pois, deixar que a criança chegue à idade da razão e decida, por si própria, o caminho que deve seguir. Esse comportamento seria o coroamento da liberdade e da tolerância diante da imposição irracional de uma orientação religiosa.

 O argumento parece ser, numa análise bastante superficial, dotado de alguma razoabilidade, mas apenas numa análise muito superficial. Com efeito, quando analisamos esse fenômeno a partir de uma perspectiva mais ampla, levando-se em consideração seus efeitos, veremos como esse comportamento pode se revestir de uma índole altamente destrutiva.

A criança é um ser místico por excelência. Ela encontra-se completamente desembaraçada de nossa prisão mental fatalista e determinista. Com o tempo, passamos a crer que as coisas são assim porque tem que ser assim. A criança sabe que não. Para ela, tudo é absolutamente inexplicável, pois ela sabe que vivemos no mundo da fantasia, enquanto nós esquecemos disso. A criança acha tão natural ver um dragão voando como ver um urubu plainando. Ela sabe da arbitrariedade do fato e do mistério. Entretanto, nós nos encontramos completamente perdidos pela força do cotidiano e pelo orgulho da ciência.

 A verdade é que nós não conhecemos nada acerca do mundo que nos cerca. Apenas observamos os fenômenos e tentamos explicá-los à luz de nossas parcas noções sobre algumas realidades. A ciência moderna gosta bastante de falar em "leis", mas é uma terminologia que carece de sentido. Com efeito, para que pudessemos descrever uma lei que rege a natureza, deveríamos conhecer todos os seus dispositivos mais íntimos.

 Entretanto, conhecendo uma ínfima parcela da realidade circundante, achamo-nos no direito de recorrer ao determinismo e acreditar piamente que, quando soltamos uma maça, o único destino possível e imaginável é o chão. A criança sabe que não o é. A criança tem então um pendor inato ao místico. Alías, todos nós o temos, mas, muitas vezes, o amor ao vil e as preocupações da vida obscurecem nosso espírito. Mas não é de espíritos de crianças que é feito o Reino dos Céus? Ela é livre para concluir o que bem entender, sem as paixões da vida ou as tentativas de auto-justificação turvarem sua intuição acerca do belo, justo e verdadeiro.

 Assim, essa sede de verdade a faz repetir inumeráveis vezes aquela palavrinha que tanto nos irrita nas criancinhas: "mas, porquê?". E a lista de "porques" se sucedem, um após outro, na tentativa de buscar o fundamento último dessa realidade. Mas geralmente suas pretensões esbarram na nossa pressa, incapacidade ou impaciência. Longe de limitar ou de doutrinar a criança, a educação religiosa a permite ver mais longe e melhor. "Se vi mais longe- dizia Newton- foi por estar de pé sobre ombros de gigantes".

Não há dúvida que a educação religiosa permite à criança uma base na qual ela possa posteriormente desenvolver seus pensamentos, seus estudos e suas conclusôes. A partir daí sim, pode-se dizer que realmente ela é livre para escolher o caminho. Não se pode falar em liberdade de optar se o sujeito não conhece de verdade as opções. Negligenciar a religiosidade dos filhos sob o pretexto de que os mesmos podem posteriormente escolher o que quiserem é como que deixar de alimentar os filhos sob o argumento de que os mesmos devem escolher o que comer. É matá-lo espiritualmente e esperar que, por um milagre de Deus, ele ressuscite.

 Ademais, como já abordado, longe de limitar as futuras opções da criança, a educação religiosa fornece as bases necessárias para que ela possa optar, realmente ciente de sua escolha. Com efeito, na cultura superficial em que vivemos, se o jovem não tiver uma sede autêntica pelas realidades mais sublimes, o único contato que ele possivelmente terá com a religião é uma mera contrafação, um espectro deformado da verdadeira realidade, pois, diante das novas realidades culturais e mercadológicas que se expandem, as religiões se apresentam como verdadeiros obstáculos à plena efetivação dessa nova imposição cultural pós-moderna.

 Por fim, quero deixar claro que, em nenhum momento, quis abordar a questão sob uma perspectiva relativista. As religiões não são iguais, nem transmitem a mesma mensagem, nem têm as mesmas finalidades. Sei que, em todas, há "sementes de verdade" e de humanidade, mas nem se comparam ao Esplendor da Verdade trazido por Cristo.

 Enquanto escrevi essas linhas, sei que, sob a face de milhares de infantes, escorreram brilhantes gotas d´água enquanto o sacerdote pronunciava o seu nome e o incorporava à Esposa de Cristo. Fico feliz por essas crianças, pois sei que possivelmente seus anseios serão parcialmente atendidos durante os seus tenros anos; mas, ao mesmo tempo, lamento profundamente aquelas que terão como símbolo de nascimento apenas as letras frias de um documento cartorário e que, pelo menos durante seus primeiros anos, serão- como dizia Sto. Agostinho-, como que peregrinos sem meta; questionados sem respostas, lutadores sem vitórias e peregrinos sem nova vida.

 Entre tanta imparcialidade, indiferença e ígnorância, a humanidade ainda segue combalida, mas de pé. Ainda.

quinta-feira, 12 de abril de 2012

Todo Poder emana do STF...




Hoje o Supremo Tribunal Federal julgou um dos casos mais importantes e polêmicos de sua História. A sociedade civil e a mídia abordaram e acompanharam, com certa apreensão e expectativa, o desenrolar do julgamento da Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental 54, que tinha por objetivo defender a possibilidade legal de se praticar aborto de anencéfalos.

Há uma série de fatores que circundam a questão. A Sociologia, Antropologia, Moral, Direito, Biologia, Medicina e um vasto campo de conhecimento encontra-se na reflexão do tema. Entretanto, não obstante a possibilidade de se abordar esta questões a partir de uma visão multilateral,tratarei de um tema específico no que concerne a este tema: a implantação da Ditadura do Judiciário.

A primeira vez que ouvi esta expressão, ouvi-a da boca de um dos Ministros do STF, que negava peremptoriamente quaisquer possibilidades de condutas arbitrárias e contrárias à democracia por parte dos excelsos Membros do Poder.

Confesso que achei a expressão demasiadamente exagerada. Tudo bem que o Poder atribuído aos magistrados está crescendo de forma claramente perceptível, mas suas decisões não são arbitrárias, ainda que polêmicas- pensava eu. Ledo engano.

A ADPF 54, julgada pelo STF, ''incluindo'' mais uma hipótese exclusão de punibilidade do aborto foi, de forma escancarada e visível, ato normativo de caráter legal. O STF não declarou a inconstitucionalidade de dispositivo nenhum. Simples e descaradamente, legislou- e sem a análise pormenorizada de todos os aspectos fáticos e jurídicos ligados à matéria, sem explicar nada de nada (a começar pela definição de anencefalia, já que esta expressão, em si mesma, induz a erro e abarca uma série de desenvolvimentos distintos do cérebro).

E eu fico pensando para onde vamos. Sempre me lembro daquela famosa frase que São Pedro teria proferido na Via Ápia, ao se encontrar com Cristo, que carregava uma Cruz e ia em direção à Roma. Enquanto Pedro fugia da cidade devidos às perseguições que os cristãos estavam sofrendo, encontra-se com Cristo e pergunta: ''Quo vadis, domini?''- Aonde vais, Senhor? Jesus teria respondido: ''Estou indo para Roma, para ser crucificado novamente''. Essa é uma pergunta que me faço a cada dia com mais frequência: para onde a Humanidade está caminhando?

Não falo aqui de perspectivas apocalípticas de um mundo degradado e animalesco. Nada disso. O que questiono são as escolhas que andamos fazemos. Estamos caminhando para uma sociedade eugênica? Estamos indo ao encontro de uma sociedade que julgue o direito de vida e de morte pela aptidão física e mental dos nascituros? Estamos valorando a vida humana, optando por quem vale mais e quem vale menos?

Dizem que não. Disse o Ministro Relator que um anencéfalo não é pessoa humana. Engraçado. Para os nazistas, os judeus e negros também não eram pessoas. Para os gregos, os bárbaros escravizados também não o eram.

Disseram que se deve poupar o sofrimento da mulher, usando termos ridicularmente apelativos e pomposos, como ''caixão ambulante'' e ''missa de sétimo dia de nove meses''. Não acho minimamente decoroso que um julgamento destes- que coloca sob os pés uma série de valores fundamentais- atreva-se a referir-se, de forma tão baixa, à ato de culto tão sublime e excelso.

Deve-se poupar o sofrimento, não é? Engraçado também. Isso que justificava a prática de idosos de países africanos deitarem-se na areia escaldante do deserto, esperando a morte chegar, pois já não eram mais úteis à sociedade, trazendo apenas sofrimento e incômodo aos que lhe são próximos.

Imagino também que isso tenha sido um dos fatores que fez com que a famosa Cidade-Estado Grega de Esparta sacrificasse bebês deficientes, jogando-os de um penhasco ou os matando de outras formas.

Eles matavam-os ao fio da espada; nós os matamos ao fio de modernos equipamentos. Eles provavelmente os matavam por reputar necessários diante das guerras constantes; nós os matamos por acharmos conveniente. Depois de tudo isso, eles são os bárbaros; e nós, depois da decisão do STF, os humanistas progressistas.

Conta-se que certa vez Alexandre Magno estava navegando para mais uma de suas conquistas quando lhe trouxeram um pirata que estava a saquear e roubar os navios que por ali passavam. Alexandre o teria repreendido duramente, ao que o pirata teria respondido: ''Eu, porque roubo em uma barca sou ladrão; e vós, porque roubais em uma armada sois imperador? Assim é. O roubar pouco é culpa; o roubar muito é grandeza. O roubar com pouco poder faz os piratas; o roubar com muito, os Alexandres''.

Somos os Alexandres da Modernidade.

Entretanto, estes pensamentos esparsos que foram surgindo querem apenas ilustrar alguns dos aspectos concernentes a esta questão. Gostaria até de deixar expressa que a decisão do Supremo afrontou diversos princípios e valores. Entretanto, gostaria aqui de me limitar à questão da legitimidade do STF em prolatá-la.

O parágrafo único do artigo 1 da Constituição Federal traz de forma expressa o que há muito está consagrado na Teoria Política: ''Todo o poder emana do povo, que o exerce por meio de representantes eleitos ou diretamente, nos termos desta constituição“.

Em uma questão extremamente polêmica como essa, que divide setores da sociedade, abordando aspectos sociológicos, jurídicos, científicos e morais, o Povo quem deve deliberar, seja por meio de seus representantes do Legislativo; seja nas formas de consulta e deliberação diretas.

E não há dúvidas que isso está sendo feito. Já há muito começaram as discussões acerca do novo Projeto do Código Penal, que traz uma série de disposições novas, inclusive aumentando as hipóteses de exclusão da culpabilidade do aborto. Ora, se o Legislativo está deliberando sobre a matéria, com acesas discussões e debates de ambos os lados, que legitimidade tem os Ministros do STF para legislarem acerca desta questão?

Originalmente, o controle de constitucionalidade de uma lei tem por objetivo expurgar do ordenamento jurídico aquelas leis que ferem a Constituição. Alguém, por gentileza, pode me dizer que dispositivo do Código Penal referente ao aborto é contrário à Constituição? Ora, o que se quis- e se conseguiu- foi que o STF, pura e simplesmente, ''criasse'' um novo inciso ao artigo 128 do Código Penal- e isso em sede de Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (afinal, no papel, cabe tudo)!

Antes eu suspeitava que os Ministros poderiam um dia usurpar poderes que não tinham legitimamente. Ledo engano. Eles já o fizeram. Sob o pretexto de interpretar a Constituição, eis que hoje estão acima da Lei- acima da Constituição, já que esta é o que eles dizem que ela é, transformando o preto em branco; e o branco em preto. Inovando, completando, expurgando e criando sob o pálido pretexto de estar interpretando.

Por isso, gostaria de sugerir ao inepto legislativo uma proposta de emenda constitucional, alterando a redação do parágrafo único do artigo I da CF, que passaria a vigorar com a seguinte redação: ''Todo poder emana do STF, que o exerce por seus ministros, nos termos das disposiçoes que os mesmos reputarem constitucionais''.

Há alguns séculos, Cícero levanta-se e perguntava, de certa forma, ao Poder Político: ''Até quando, ó Catilinas, abusarás de nossa paciência?''. Parece que esse grito de Justiça não funcionará na Justiça. A tribuna não suportará a voz de alguém que a acusa.

Hoje percebi que um dia nós abrimos nossos olhos e vemos que a barbárie não está na ignorância de povos tecnologicamente atrasos, mas sim que está arraigada no coração dos homens.

E aprendemos que sempre tememos a arma do pirata, mas muitas vezes nos esquecemos das Armadas dos Alexandres.

quinta-feira, 7 de julho de 2011

Somos todos soldados, armados ou não



Na famosa música de Geraldo Vandré, há uma estrofe que diz:

Nas escolas, nas ruas, campos, construções
Somos todos soldados, armados ou não
Caminhando e cantando e seguindo a canção
Somos todos iguais braços dados ou não
Os amores na mente, as flores no chão
A certeza na frente, a história na mão
Caminhando e cantando e seguindo a canção
Aprendendo e ensinando uma nova lição

Somos todos soldados- diz a música- e o somos nas escolas, ruas, campos e construções; entretanto, que raios de soldado milita desarmado?

A música mesma nos responde. Estamos, sim, todos armados: os amores, as certezas, a História- enfim, a força e a vontade de lutar pelos sonhos e os ideais.

Eu acredito muito na força e no simbolismo dos contos-de-fada. Pequenos, somos encantados pelas estórias de nobres guerreiros que arriscavam suas vidas para lutar pela Princesa, pelo Reino, pelo Povo ou por qualquer coisa que seja.

Na verdade, - e eu acredito piamente nisso- o que nos encanta, quando pequenos, não é o Reino, nem a Princesa, nem o Povo, mas sim a luta; entendida como a doação de si mesmo para aquilo que o herói acredita que é o certo, o valor, o justo, o santo.

Sempre me encantei pelas epopéias, pela guerra, pela luta. Obviamente, não pela morte, pela dor ou pelo sofrimento que estúpidas guerras causaram à Humanidade, mas sim pelo valor de certos homens que, arriscando tudo o que possuíam, desembanhavam as espadas para lutar por aquilo em que acreditavam: o País, a família, o Cristianismo.

A verdade é que somos todos soldados. Somos todos sujeitos ativos na História, quer o queriamos ou não; entretanto, é com muita tristeza, que, dentre esses soldados, hoje há muitos deserdores.

Tantos há que, acomodados em sua situação, deixam-se serem levados pela vida, passivamente, cantarolando, com seus atos: "deixa a vida me levar, vida leva eu"

Dante Alighieri, em sua clássica Divina Comédia, reserva um lugar especial para os "indiferentes", aqueles que viveram "sem jamais ter merecido/Nem louvor, nem censura infamadora". São obrigados a passar o tempo correndo atrás de uma bandeira, enquanto animais ferozes os atacam.

A esses se aplicam as palavras do poema "Embora quem quase morre esteja vivo, quem quase vive já morreu".

É hora de perdermos esse marasmo de uma pseudo cultura de Paz e Amor, que não é nada mais do que indiferença e relativismo. É hora de nós, soldados, utilizarmos nossas armas: a história na mão, a certeza na mente, as flores no chão e o amor no coração.

sábado, 2 de julho de 2011

''Não importa o que dizem de você, mas sim quem diz para você''




Esta frase, ouvi-a do meu colega Evaldo Silva, e achei-a linda, por unir concisào, profundidade de sentido e simplicidade de forma.

Isso me remonta a uma graciosa estória. Estava um homem já idoso e um menino com um jumento caminhando em uma estrada. Como era de se esperar, o idoso estava sentado no animal enquanto o jovem caminhava a pé, ao seu lado. Depois de algum tempo de caminhada, passaram por duas pessoas que comentaram:"Que absurdo! Um homem deste tamanha sentado no jumento enquanto o pobre menino caminha só".

Então, eles se entreolharam e resolveram trocar de lugar. O menino montou o jumentinho e o homem caminhava a pé ao seu lado.

Passaram, então, por duas senhoras, que comentavam: "Isso é um absurdo! Não se respeitam mais os mais velhos como antigamente. Veja só: enquanto o pobre homem caminha a pé, aquele menino folgado vai no montado no jumento".

Os dois se entreolharam e tomaram uma decisão: os dois iriam em cima do jumentinho. Tudo resolvido. Ninguém mais iria reclamar...

Ledo engano. Caminharam mais um pouco e se encontraram com uma mulher, que bradava:"Seus cruéis. Os dois montados sobre este pobre jumentinho. Seus desalmados".

Os dois, então, pararam, entreolharam-se, colararam o jumento em seus ombros e continuaram a caminhar.

O elemento cômico desta estória mostra o ridículo a que se expõe aqueles que, ao valorizarem determinadas críticas, tomam resoluções totalmente desarrazoadas.

E, agora, posso chegar ao cerne da questão: a parada gay de São Paulo.

Como é de conhecimento de todos, a parada gay se utilizou de imagens de santos católicos em posses e situações de sensualidade com forte entonação homossexual.

Infelizmente, não posso simplismente desprezar essa canalhice. Eu bem que o gostaria, pois ser desprezado é pior que ser combatido; pois, quando combatemos alguém, de certa forma, demonstramos sua importância; mas quando desprezamos simplismente reforçamos sua insignificância.

Entretanto, não posso desprezar esse ato execrável, já que a maioria da população católica não atentou ainda ao processo a qual estamos submetidos- e é dever dos católicos alertar ao perigo que estamos sofrendo.

A verdade é que este caso não é algo pontual e efêmero. Estamos no meio de um turbilhão feroz que tem por objetivo arrancar, até as raízes, tudo o que ainda há de cultura cristã em nossa sociedade.

O Movimento GBLT tem o Cristinismo- e, de forma especial, a Igreja Católica- como seus grandes inimigos, como o grande veneno e o grande mal da sociedade para o qual não há escárnia suficiente nem zombaria à altura.

Já há muito tempo há todo um sistemático ataque aos valores cristãos, e o Movimento GBLT tem um papel fundamental nesta tentativa de construção de novos valores (que valores? Ninguém sabe, nem os próprios arautos da Modernidade).

Há piadas cômicas, se não fossem trágicas, como o novo projeto de Lei e o projeto de emenda constitucional que eles pleiteiam, blindando-os de qualquer forma de crítica e promovendo uma vitimização ilária.

A Ditadura gay é a que mais fala de respeito, e é o movimento que mais desrespeita.

Eis alguns exemplos de que falo:

Infelizmente, o grande intelectual brasileiro, Olavo de Carvalho, é meio desbocado, mas vale a pena ouvi-lo, do qual ele fala do projeto de reestruturação mundial (Nova Ordem Mundial):







segunda-feira, 28 de março de 2011

Um dia me disseram que as nuvens não eram de algodão


"Um dia me disseram que as nuvens não eram de algodão..."- entoa uma música brasileira.

Isso me faz lembrar as doces recordações da minha infância, em que o mundo se me apresentava como uma realidade extremamente mágica, incrível, e maravilhosa demais para ser racionalizada, restando-me apenas admirá-la, como diria o saudoso Chesterton.

Como eu já tive a oportunidade de comentar aqui, eu não queria crescer, quando criança. O "mundo dos adultos"- com seus hermêticos e intricados problemas- parecia uma realidade muito distante e penosa. Preferia esconder-me sob o véu invísivel da minha infância, mantendo a vida como um idílico sonho, recheado de uma proteção imaginária e cercada das ternas alegrias infantis.

Mas o tempo- essa terrível realidade que não nos permite nos darmos ao luxo de caminharmos com nossas próprias pernas, mas sempre nos impele que nos submetamos ao ritmo que ele despoticamente nos impõe- arrastou-me para além dos imaginários limites que eu tinha traçado da minha infância- e se eu pudesse personificá-la, imaginá-la-ia cantando para mim, como na clássica música: "Ainda é cedo, amor. Mau começastes a compreender a vida, já anuncias a hora de partida, sem saber mesmo para onde vais (...) Ouça-me bem, amor, preste atenção: o mundo é um moinho. Vai triturar teus sonhos tão mesquinhos, vai reduzir tuas ilusões a pó".

Crescemos todos nós e aprendemos muitas coisas, mas, infelizmente esquecemos os cândidos ensinamentos que nossa infância quis nos deixar de herança.

Passamos a racionalizar o mundo, o homem, a alma, esquecendo-se da mais sábia disposição infantil: o mundo e o homem são como os contos de fada: impossíveis de racionalizá-los, restando-nos apenas admirá-los. Trocamos nossos mais altruísticos e nobres desejos pela mais próxima quinquilharia que se nos é oferecida. Substituimos os relacionamentos baseados na confiança e no amor mútuos por relacionamentos marcados pelo ciúmes, inveja, ambição e orgulho.

Encantam-me os olhos de um bebê, de uma criancinha: olhos vivos, como que querendo absorver, de um só golpe, todo o Universo, trazer todas as sensações, experimentar todas as realidades.

Deve ser por isso que sou encantado pelo Pequeno Príncipe, de Exupery. É a realidade da alma humana que ele visita, ao visitar os planetas; afinal, como diziam os antigos gregos: o homem é um mundo em miniatura. E o melhor: tudo isso visto pelo olhar daquele que ainda sabe se fazer criança.

Geralmente, ao crescermos, cubrimo-nos de máscaras, pois sentimos a necessidade de enquadrarmos nossa personalidade, nossa maneira de ser e de viver nas exigências socias. Deixamos de fazer aquela cândida observação, de falar aquela tosca e agradável bobagem, de fazer aquela grande futilidade.. deixamos, enfim, de sermos nós mesmos, para parecermos sermos alguma coisa para os outros.

Alguns, pensando desferir-me uma crítica, enchem-me de lisonja, ao olhar para mim com ares de reprovação e dizer: "Tsc, tsc, parece uma criança"- então eu vejo que ainda há esperanças, que minha infância ainda me deixou legados, que ainda hei de perscrutar e achar belos tesouros nas caminhadas da vida.

Como disse um bacharel de Direito (Rodrigo Zimmerman) em seu discurso de formatura http://www.youtube.com/watch?v=TAATndQBfg4,

"E para terminar, meus queridos, gostaria de fazer um pedido para vocês.Não abondonemos a ingenuidade, não abondonemos o sonho impúbere. Meus queridos, quando olhamo-nos no espelho, vejamo-nos crianças, façamo-nos pequenos, quando tudo nos era grande".

Talvez é chegada a hora de abatermos nosso orgulho e, pensarmos, ainda que em um breve momento, que realmente, talvez, no fundo, no fundo, as nuvens nunca deixaram de ser de algodão e que, no fundo, vivemos em um conto de fadas, escrito num livro chamado Mundo.

segunda-feira, 17 de janeiro de 2011

Os sonhos são reais




http://www.youtube.com/watch?v=m9TAv-04qSs

Eis, acima, o trailler do filme "A Origem", protagonizado por Leonardo Di Caprio, com um roteiro que demorou mais de uma década para ser escrito.

O filme penetra nos mundo dos sonhos- ou melhor, no mundo da mente, das idéias.

Nele, o personagem trabalha com uma máquina que é capaz de invadir as mentes, penetrando no subconsciente das pessoas ligadas à máquina. Por meio desses aparelhos, ele consegue extrair sonhos- uma espécie de espionagem onírica.

O grande desafio para o protagonista, no entanto, é conseguir inserir uma idéia em uma mente (daí o nome original do filme: Inception).

O filme deixa bem claro o papel fundamental que as ideias tem na realidade humana. Ela não é um acessório- ela é a arma mais perigosa que se pode utilizar. Por meio da inserção de uma simples ideia no herdeiro de uma empresa, o personagem quer destruir um grande imperio financeiro de uma multinacional de energia.

O filme me fez lembrar de uma frase que eu gosto sempre de dizer: são as ideias que movem o mundo- e é incrível como as pessoas não se lembram disso.

Geralmente, ao se falar das grandes reviravoltas da História, ao se falar dos grandes planos sociais, ao se desfilar as grandes conquistas ou as amargosas derrotas sempre se citam fatos, personagens, isso ou aquilo, mas muitos não percebem que, na verdade, tudo isso era movido por ideais, planos, sonhos...

Há uma frase que eu aprecio bastante que diz: "O medíocre discute pessoas. O comum discute fatos. O sábio discute idéias".

Ao deitarmos nossos olhos no espetáculo dramático da História humana, podemos visualizar isso de forma mais real- e mais dolorosa.

O mar de sangue que banhou a Europa, trucidando homens e mulheres, crianças e adultos, leigos e religiosos, pobres e ricos, teve sua origem não em um agitação política, nem em um líder nato. O Vale de Sangue que temou a Europa no século XX teve sua causa em uma ideia: o Comunismo. Por acreditar nele, que exércitos se moveram, que guerras aconteceram, que cidadãos foram massacrados, que famílias foram despedaçadas. Era para muitos um sonho, um ideal nobre... Mas o sonho desabou sobre suas cabeças e o castelo de sonhos deixou marcas muito reais- uma trilha de sangue em toda a Rússia, em toda a União Soviética.

Foi a ideia de que a raça ariana era superior que levou milhões à morte durante o Nazismo. Foi a ideia do nacionalismo que levou países às mais cruentas guerras.

O grande perigo da humanidade não são as armas de ferro e de fogo; não são os grandes exércitos, nem as bombas de Hidrogênio. O grande perigo da Humanidade são as más idéias, os fúnebres ideais, os macabros sonhos.

E então, mais uma vez, não posso deixar de lembrar da implacável- e furiosa- reação da Igreja contra as Heresias. Ela, perita em Humanidade, caminha há dois milênios com os homens neste vale de lágrimas. Ela sabe a força devastadora que uma ideia- que uma palavra- pode ter.

Os inquisitores abrasavam fogueiras não para conter revoluções ou líderes oposicionistas- mas para conter ideias, que seriam mortais, como a dos albiginenses. Sabiam que uma ideia virulenta dissimulada só levaria à morte e a destruição. Sabendo da força de um ideal, usavam a força física; hoje eminentes literatos reclamam das torturas físicas sem perceberem que praticam algo muito pior em suas obras pestilentas: a tortura moral. Que o diga um eminente escritor que abordado em sua sala por um leitor, assustou-se ao vê-lo ofegante dizendo que ia se matar... e que a culpa era dele, do escritor. Saiu correndo e em pouco tempo jazia morto.

Na Idade Média, o povo não hesitava em matar para se proteger de uma ideia. Hoje, são as ideias que matam- e as vítimas são muitíssimo mais numerosas.

Mas hoje me dia, em uma sociedade extremamente materialista, é difícil perceber isso. Essa verdade parece cada vez mais escondida pela "realidade da matéria"- assim as loucas ideias circulam mais livremente, já que, para a maioria, elas sequer existem, ou, se existem, não oferecem perigo. E assim o mal escondido se torna mais pestilento, porque é tratado não com as armas e as forças que merecem, mas, escondido, é visto, no máximo, como uma características dos tempos- Oh tempora, oh mores.

As ideias são os grandes motores da humanidade para o bem e para o mal.

Apesar de hesitar, não resisto a terminar com um trecho do livro "Ortodoxia", de Chesterton:

"A Igreja ortodoxa nunca tomou a rota fácil ou aceitou as convenções; a Igreja ortodoxa nunca foi respetável. Teria sido mais fácil aceitar o poder terreno dos arianos. Teria sido mais fácil, durante o calvinista século XVII, cair no abismo infinito da predestinação. É fácil ser louco, é fácil ser herege. É sempre fácil deixar que cada época tenha a sua cabeça; o difícil é não perder a própria cabeça. É sempre fácil ser um modernista; assim como é fácil ser um snob. Cair em qualquer uma das ciladas explícitas do erro e do exagero que um modismo atrás de outro e de uma seita depois de outra espalharam ao longo da trilha histórica do cristianismo- isso teria sido de fato simples.
É simples cair; há um número infinito de ângulos para levar alguém à queda, e apenas um para mantê-lo de pé."

quarta-feira, 15 de dezembro de 2010

O leão e o Cordeiro




Neste período do Advento, os corações cristãos já estremecem diante da expectativa do Natal. A contemplação do Menino Jesus, deitado numa manjedoura, comove os mais empedernidos corações e arranca dos lábios piedosos as mais ternas canções em que Deus é tratado de forma nunca antes imaginada: "Noite Feliz! Noite Feliz!(...) Pobrezinho, nasceu em Belém (...) Dorme em paz, ó Jesus. Dorme em paz, ó Jesus".

Esperávamos um Messias que tirasse Jerusalém do julgo Romano e que governasse com cetro de ouro os assuntos temporais da Terra. Ansiávamos por um líder nato que governasse com maestria e dominasse com força. Mas Deus, que às vezes quase me parece apresentar como que um certo senso de humor, para nos derrubar do pedestal de nosso orgulho e afirmar que Ele não é como nós, vêem ao nosso encontro pedindo colo, no corpo de frágil bebê e dizendo: “O meu reino não é deste mundo”.

E então nossos corações ficam mais uma vez abismados com a forma desconcertante de Deus agir, pois, assim como é distante o céu da Terra, são distantes os nossos pensamentos de Seus pensamentos. Os mitos antigos assustaram a humanidade com o Ragnarok- a morte dos deuses-; mas como agora é a vez de Deus assustar a Humanidade: e então, o Verbo de Deus se fez Carne e habitou entre nós.

Mas, neste pequeno bebê, parece que estão presentes todos os paradoxos, estão latentes todas as forças. N’Ele percebemos que a Misericórdia e a Justiça; a Luta e a Mansidão; o Ódio e o Amor não apenas se cumprimentam, mas sim se beijam.

E ao lembrar da Bíblica profecia, ficamos enternecidos por tal fineza em Seu amor: "O lobo e o cordeiro viverão juntos e o leopardo deitar-se-á ao lado do cabrito".

O Leão de Judá, o Rei dos Reis, Aquele para quem tudo foi feito nos vem mais frágil do que um Cordeiro. Ao contemplarmos o Divino Infante, como que vemos em Sua Pessoa o Leão de Sua Realeza e Sua Onipotência deitado com sua mansidão e humildade- a mansidão e humildade do Cordeiro de Deus.

O Eterno irrompe no tempo. Aquele que é Infinito surge na História Humana. Aquele que transcende o Espaço, o Tempo e a Matéria encarna-se como um pequeno infante. Tudo são contrários, tudo são desconcertos, tudo são paradoxos, porque Tudo É Amor!

E essas finezas de Seu amor são perceptíveis em toda a Sociedade Cristã. Fazer o Lobo deitar lado a lado com o Cordeiro: eis o desafio que o Cristianismo enfrentou; eis o milagre que conseguiu.

Como argutamente percebeu o filósofo britânico G. K. Chesterton, o equilíbrio cristão não está no meio dos contrários, mas sim em sua correta justaposição. Não diz para o Leão ser manso, nem para o Cordeiro ser valente; mas diz sim, preservando as qualidades de cada um, faz que um se deite ao lado do outro. Muitos esperariam daí uma catástrofe, mas o que veio foi um milagre.

Essa justa composição dos extremos esteve presente em toda a História do Cristianismo. A ferocidade do Leão fez bravos cruzados mergulharem suas espadas no sangue para livrar a Europa dos ataques mulçumanos. A mansidão dos Cordeiros fez santas e santos agradecerem aos seus carrascos e os beijarem na face. O amor ao mundo fez com que os cristãos chamassem a natureza de “minha irmã, provinda da mãe do mesmo Pai”, mas o ódio pelo mundano fez com que os santos bradassem e nações inteiras se convertessem. O amor à vida humana fez com que os cristãos dissessem às esposas: “sejam fecundas”, e o amor pela vida espiritual fez com que dissessem às consagradas: “não tenham filhos”. Só mesmo esse milagre da justaposição harmônica dos contrários fez com que pudéssemos odiar com todas as forças o pecado, mas amar com toda a doçura o pecador.

O equilíbrio então encontrou um novo ponto; ou melhor, inspirado em Cristo, a humanidade encontrou um novo equilíbrio. A virtude- que para os pagãos estava no meio- descobre-se perdida nos cantos opostos da alma humana.

E hoje as festivas luzinhas coloridas nos relembram que a própria Luz veio à Terra. Ele veio para o que era Seu, mas os seus não O receberam; mas temos a graça de ter conosco Ele mesmo, por meio de Sua Igreja.

Termino com Chesterton, a quem devo todo esse texto:

”É simples cair; há um número infinito de ângulos que leva à queda, e apenas um para mantê-lo de pé. Cair em qualquer um dos modismos, do agnosticismo à Ciência Cristã, teria de fato sido muito óbvio e sem graça. Mas evitá-los a todos tem sido uma estonteante aventura; e na minha visão a carruagem celestial voa esfuziante atravessando as épocas. Enquanto as monótonas heresias estão esparramadas e prostradas, a furiosa verdade cambaleia, mas segue de pé".

segunda-feira, 29 de novembro de 2010

Entre a caridade e a filantropia


Belo texto do Padre Antônio Vieira (o cearense) em seu livro "100 Cortes sem Recortes", 1966




As Freiras

Conta-se que a renomada e não menos celebérrima artista de cinema, Rita Hayworth, mais tarde princesa Ali Khan, em visita a um leprosário do Oriente, observou uma jovem religiosa as feridas purulentas de um leproso. Torcendo o seu rosto hipersensível de artista, a bela e requintada atriz disse para a freira:
- Irmã, eu não faria isso nem por um milhão de dólares.
- Nem eu, respondeu a humilde religiosa, sem interromper o seu humilhante trabalho de caridade.
A vida das religiosas é esta história continuada e perene de heroísmo. Dia por dia. Noite adentro. Durante toda uma existência. Atrás de si, deixaram os carinhos e ternuras dos parentes. Os sonhos e as esperanças de uma juventude risonha e feliz. As alegrias e prazeres que o mundo oferecia. As riquezas, a notoriedade, as posições, o luxo, a comodidade. Tudo mesmo. Em troca dos leprosos. Dos filhos sem pais. Dos homens sem saúde ou sem juízo. De todos os infelizes e desgraçados.
Quem as vê passar, de cabeça baixa, olhos pregados no chão, o rosto escondido em negro véu, trajando um hábito feio e desanilhado, ou quem as observa, escondidas atrás de muralhas sem horizonte, há de pensar naturalmente que também nelas morreu a alegria, a felicidade, a juventude.
Puro engano. Ninguém mais feliz neste mundo do que aquele que faz o bem. Nenhuma sensação e felicidade existe maior do que consolar os aflitos, enxugar lágrimas, aliviar dores.
Anjos da caridade, elas se multiplicaram num milagre de bondade, quando nos hospitais vão distribuindo esperanças aos enfermos nos seus leitos, coragem nas salas de operação, renúncia e conformidade junto aos moribundos.
Injuriadas por uns, amesquinhadas por muitos, perseguidas e fuziladas em muitos países, incompreendidas por quase todos, elas não se anulamsurgem, como por milagre, do sangue e das lágrimas das suas próprias co-irmãs, para realizarem na terra, a sublimíssima missão de caridade cristã, e perenizarem, entre os homens, a herança divina do amor ao próximo.
Na China, onde durante séculos o cristianismo encontrou a mais tenaz e dura resistência, ultimamente, legiões de chineses acorrem aos hospitais de religiosas ou às missões católicas para pedirem que lhes falem desse Deus, que ensina os homens a serem tão bons e caridosos para com os infelizes e desgraçados.
O mundo se há de melhorar e modificar, não pela influência das Ciências e das Letras, mas pela força da Caridade e da Bondade, que se irradiam das mãos espirituosas e angélicas das humildes religiosas.

segunda-feira, 15 de novembro de 2010

Terra dos Homens




Ontem, dia 14 de Novembro de 2010, foi um dia festivo e alegre para vários jovens da Paróquia de São Gerardo: o Movimento Juventude Shalom da Paróquia completou sua décima segunda primavera, com direito a apresentação de uma bela peça teatral e da presença do pároco.

Era claramento visível no sorriso de vários deles a alegria daquele momento, a euforia daquela comemoração, o contentamento naquela celebração.

Depois da Santa Missa, dirigimo-nos a uma lanchonete, com o propósito de finalizarmos aquele momento diante de uma amena refeição.

No meio das acoloradas convesas, dos exuberantes sorrisos, das animadas conversas, aparece-nos de surpresa uma senhora, já com seus cinquenta anos. Com um pequeno véu na cabeça, visivelmente bêbada, aproximou-se de nós falando as típicas trivialidades daqueles que se deixaram vencer pela bebida: "Sou Dilma. Eu sou é Dilma. Mas perâ aí, deixa eu sentar que eu tô beba".

Afastou-se um pouco de nós. Pudemos esquecer um pouco de sua presença, porém isso não durou muito tempo. Sentou-se na mesa ao lado e começou a exigir que a deixássemos em casa de carro: "Porra! Eu tô bêbada. Me deixa em casa. Vocês são maus. Todo mundo sabe ser mal, mas quando é para ajudar!"

Um grande amigo meu que estava ao meu lado ainda se mostrou solícito:

Ele: "Onde é que a senhora mora?"
Ela: "São Gerardo"
Ele: "Mas em que rua?"
Ela: "São Gerardo".
Ele: "Não, eu sei, mas quero saber a rua.
Ela: Vai...

Bem, não repetirei aqui as palavras agressivas que se seguiram, o que deixou meu amigo visivelmente irritado.

A presença começou a ficar demasiadamente incômoda. Disse que tinha que voltar para casa, pois amava o marido. Disse que ele estava morrendo. Disse que era cigana. E continamos a sermos incomodados pela inoportuna presença daquele senhora bêbeda e agressiva naquele momento festivo. "Ou vocês me matam ou eu mato todos vocês"- chegou a dizer em um dos delírios causados pelo álcool.

Tomou a liberdade de sentar-se conosco à mesa. Dentro em pouco, duas jovens que estavam ao seu lado procuravam conversar com ela, alertando para o risco da bebida. Quando percebi, a senhora estava aos prantos. Seu marido estava morrendo com câncer. Dava golfadas de sangue. Ela dizia insistentemente que o amava e que ele precisava dela.

Percebi, só então, que aquele vício era a forma que ela tinha de esquecer seus sofrimentos, suas misérias, seu marido... de esquecer-se do mundo e de si mesma. Senti-me emocionado diante daquela mulher.

Ela via a morte do seu marido chegar a passos largos- acompanhada de dolorosa agonia e de derramamento de sangue. E assistia aquilo impotente, com as mãos amarradas e os olhos marejadas.

Não a conheço. Provavelmente, nunca a tinha visto antes, nem sequer de relance; mas aquela mulher parecia trazer em si as marcas de uma vida carregada de sofrimentos e sulcada de amarguras - e agora, já idosa, tinha que assistir impotente ao desfalecimento do seu marido.

Ali, a vida me pregava mais uma de suas peças. A alegria exuberante de um momento festivo se deparava, nua e crua, diante do sofrimento e da miséria. Suas lágrimas eram o contra-ponto de nossos sorrisos; seu desabafo, o oposto de nossas conversas.

Assim, somos nós nesta Terra dos Homens. Caminhamos neste Vale de Lágrimas entre as alegrias e as tristezas; as festas e os lutos; a vitalidade e o desfalecimento; o gozo e a dor; a felicidade e as tristezas.

A verdade é que a vida é uma "Roda Viva". Lembro-me que, quando pequeno, minha avó sentou-me no colo, pegou a minha mão, e começou a "desenhar" com seu dedo um círculo, explicando-me que a vida é cheia de altos e baixos, e que nunca sabemos o que nos espera na sua próxima etapa.

Eu estava em uma lado da mesa oposto ao dela. Tenho plena consciência que amanhã posso ocupar o espaço que ela ocupava ontem. Percebi, mais uma vez, que há milhões de almas nesta Terra dos Homens que, consumidas pela dor, necessitam de uma apoio, de uma ajuda, de um ombro amigo- e que também é meu dever ouvir àqueles a quem o mundo não dá direito à palavra e falar àqueles a quem o mundo não quer a presença.

Se andarmos juntos, as quedas da vida serão menos dolorosas, pois o amor não sabe calcular direito: pois quando estamos juntos ele multiplica as alegrias, mas divide a dor.

quinta-feira, 4 de novembro de 2010

Aposentadoria Honrosa


Reproduzo aqui uma das histórias mais interessantes que eu conheço, na narrativa do padre Carlos G. Vallés, SJ, no livro "Saiu o semeador...

"Aposentadoria honrosa

Esta é uma história verdadeira, dos anais das estradas de ferro da índia.

Um trabalhador chamado Ramsharan Chaudhari aposentou-se, depois de haver trabalhado durante trinta anos no mesmo cargo, na mesma estação de Benarés.
Seus companheiros e chefes organizaram uma festa de despedida, com as honras que ele merecia, por sua constância e fidelidade ao trabalho, e lhe ofereceram um relógio de ouro, que cada um ajudara a pagar.
Foram feitos discursos, e lhe deram felicitações, e o diretor geral da ferrovia, que presidia a festinha, perguntou:
- Você poderia, por favor, nos explicar que tipo de trabalho foi que realizou tão fielmente, durante todos esses anos?
O bom homem mostrou então o grande e pesado martelo que tinha sido seu fiel companheiro e sua única ferramento durante trinta anos, e que trouxera consigo à festa, e explicou: - "Quando um trem chegava ou saía da estação, eu tinha que dar uma martelada direta em cada roda, de cada vagão, e gritar: "Vale!" Era só o que eu fazia.
- E será que poderia nos dizer- insistiu o inspetor geral- para que fazia isso?
E o honrado trabalhador respondeu:
- Isso eu nunca fiquei sabendo, senhor.
Quem deve saber são vocês da diretoria.



O bom homem tinha passado toda uma vida experimentando as rodas dos trens sem saber o que fazia, isto é, sem experimentá-las. O barulho que produz a roda, quando recebe uma martelada, e que é diferente em cada caso, devria dizer ao trabalhador, bem preparado para seu ofício, se a roda estava ou não em condição de continuar sendo usada na viagem. Mas àquele homem não tinham ensinado essa parte de seu trabalho, e ele tampouco havia perguntado. Durante longo trinta anos, vinha martelando roda depois de roda,e gritando: "Vale!", e ia para casa satisfeito, todas as noites, por ter cumprido o dever e ganhado honestamente seu salário. Não importa quantos acidentes de trem ocorreram durante todo esse tempo, por causa de um defeito não descoberto em uma roda qualquer. Ele tinha feito com a maior fidelidade, ao longo dos trinta anos, a mesma coisa que lhe tinham mandado fazer no primeiro dia de serviço.

Achava que não devia fazer perguntas, para não criar problemas. Bastava fazer exatamente o que lhe haviam dito. Ainda que as ordens parecessem absurdas, ele pensava que os superiores entendiam e sabiam o que estavam fazendo. Não lhe pagariam salário para nada fazer. Alguma razão deviam ter para que o mandassem dar aquelas marteladas. O trabalho talvez fosse monótono e cansativo, mas o bom homem sentia-se orgulhoso, porque cumpria seu dever. E passara uma vida inteira dando marteladas. E, no fim, ganhou um relógio de ouro de presente. Uma aposentadoria honrosa.

Não faça perguntas. Os chefes sabem de tudo. Muito embora não parece fazer sentido algum no trabalho que você faz, continue trabalhando. Tudo o que pedem é que você faça o que mandam. Continue dando marteladas nas rodas. Dia após dia. Trem após trem. Faça a mesma coisa que mandaram fazer no primeiro dia, embora a tenha de fazer durante muitos anos. Os princípios eternos não se alteram. Continue assim a vida inteira, e no final talvez ainda ganhe um relógio de ouro. E farão uma festinha em sua honra. E, se alguém perguntar o que você fez a vida inteira, não tenha vergonha de responder. Todos eles fizeram a mesma coisa."

Padre Carlos G. Vallés